terça-feira, 28 de outubro de 2014

Refluxo: sua relação com a alimentação — Parte 2




No primeiro post dessa série, exploramos como uma dieta com redução de carboidratos pode auxiliar na redução de sintomas e no tratamento do refluxo. Comentamos também sobre o fato de que os medicamentos normalmente utilizados no controle dessa patologia podem, ao invés de melhorar, piorar o quadro da doença.

Para mostrar a efetividade da redução de carboidratos sobre sinais e sintomas do refluxo, aqui está um caso real.


Caso de hérnia de hiato

Indivíduo jovem, do sexo masculino, sem sobrepeso ou obesidade, realizou uma endoscopia de rotina e descobriu que possuía hérnia de hiato. Essa doença é caracterizada pelo deslocamento, ou protrusão, de uma parte do estômago através da musculatura do diafragma. O resultado disso é uma alteração anatômica e fisiológica do estômago, modificando a funcionalidade do esfíncter esofágico inferior (estrutura muscular que comunica o esôfago ao estômago) — facilitando o refluxo do conteúdo estômago para o esôfago [1].

É por isso que pacientes com hérnia de hiato normalmente apresentam refluxo [2]. Esse era justamente o caso do paciente em questão: hérnia de hiato + refluxo.

A imagem mais à esquerda é a do estômago normal, enquanto que as demais figuras correspondem a duas situações de hérnia de hiato. Importante de se observar é que, em ambos os casos de hérnia, a anatomia e funcionalidade do estômago e do esfíncter esofágico inferior são alteradas.


[Clique na imagem para visualizá-la em tamanho real]


Veja a situação inicial do esôfago do paciente, já com lesões consideráveis:


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As partes com um vermelho mais vivo, junto com uma coloração esbranquiçada, são as lesões no esôfago. Circulei uma delas na imagem da esquerda para ficar mais fácil de observá-las. É possível ver diversas e extensas lesões causadas pelo refluxo.


Tratamento

Como já havia lesões severas, e como a hérnia de hiato já estava relativamente avançada, o médico levantou a possibilidade de realizar uma cirurgia no estômago do paciente para corrigir o problema. O objetivo da cirurgia seria principalmente para melhorar os sintomas do refluxo e as lesões esofágicas causadas por essa doença, os quais provavelmente ocorreriam porque a estrutura do estômago seria remodelada para prevenir esses efeitos adversos.

Entretanto, antes de um procedimento mais severo, o médico prescreveu o tratamento tradicional para o tratamento do refluxo: um remédio para reduzir a secreção de ácido no estômago e outro para aumentar a motilidade desse órgão. A menor secreção ácida naturalmente faria com que o conteúdo do estômago se tornasse menos danoso às células do esôfago, sempre que houvesse refluxo. A maior motilidade no estômago faria com que o alimento permanecesse menos tempo no estômago e também estimulasse menos a secreção ácida, desfavorecendo o retorno do conteúdo do estômago para o esôfago. Na hipótese de melhora, o médico sinalizou que a medicação deveria ser utilizada de forma contínua (por período não determinado) pelo paciente. A descontinuidade do tratamento poderia comprometer qualquer melhoria alcançada ou até piorar o quadro.

Pela ânsia de tratar as lesões causadas pelo refluxo, e logicamente pelo receio da doença progredir, o paciente decidiu seguir a orientação média. Inicialmente, o tempo de tratamento com os dois medicamentos seria de 6 meses, quando, ao final do período, o paciente retornaria ao consultório médico para realizar uma nova endoscopia. O prognóstico não era tão otimista, uma vez que o médico não garantiu que haveria melhora rápida e significativa das lesões no esôfago — pelo menos não no curto ou médio prazo.

Após 2 meses de tratamento com os medicamentos, o paciente percebeu que sua alimentação poderia estar interferindo de alguma forma nos sintomas do refluxo. Pouco tempo depois, ele tomou conhecimento que uma dieta com redução de carboidratos poderia ajudar no tratamento do refluxo.

Nas primeiras semanas em que modificou sua alimentação, continuou tomando os remédios como “garantia”. Entretanto, já a partir do terceiro mês o paciente resolveu abandonar os medicamentos para observar apenas o efeito da dieta sobre a sua condição.

O resultado de 3 meses realizando apenas uma dieta com redução de carboidratos foi o seguinte:

[Clique na imagem para visualizá-la em tamanho real]


Como pode ser observado, houve melhora significativa das lesões com a adoção de uma dieta reduzida em carboidratos. As lesões passaram a ser quase que imperceptíveis. Além disso, os sintomas do refluxo, que no caso desse paciente era a pirose (azia), também desapareceram.


Tratamento alternativo do refluxo: probióticos

Como comentamos na primeira parte desse post, o refluxo é comumente causado pelo aumento na pressão intra-abdominal, a qual pode ser facilmente decorrente do supercrescimento bacteriano no intestino delgado (SIBO) — onde a produção de gases desencadearia o aumento na pressão.

Existe a possibilidade de uma dieta reduzida em carboidratos (low-carb) não ser tão efetiva em alguns casos de refluxo? Provavelmente... Existe a possibilidade de uma dieta low-carb não ser tão efetiva no longo prazo, mesmo quando é efetiva no curto ou médio prazo? Também...

Isso pode acontecer porque a proliferação bacteriana, seja no intestino grosso ou delgado, é dependente dos substratos que fornecemos a elas (fibras alimentares, amido resistente, oligossacarídeos etc.) e também dos tipos de bactérias que existem no nosso intestino. Se não houver os tipos de bactérias com as quais evoluímos, e que normalmente colonizam nosso intestino grosso ao invés do intestino delgado, existe a maior possibilidade de crescimento de bactérias que não deveriam estar se proliferando no trato gastrointestinal.

É preciso entender que as bactérias competem entre si por espaço, alimento e condições para sobreviverem em nosso intestino. Assim, caso uma dieta low-carb não funcione corretamente em alguns casos de refluxo, é possível que o balanço entre as bactérias precise ser alterado, par que as bactérias “benéficas” façam com que as bactérias “ruins” percam espaço e descolonizem o intestino delgado. E isso possivelmente pode ser alcançado com a suplementação de probióticos (aquelas bactérias que são capazes de habitar e se desenvolver no trato digestório) e com a adoção de algumas outras práticas importantes.

Esse é um assunto muito escasso de evidências na literatura científica, e pretendo abordá-lo com mais detalhes futuramente. Considere conversar com um nutricionista ou profissional de saúde qualificado para saber se a utilização de probióticos, além de um plano alimentar individualizado e específico para essa finalidade, deve ser adotada.


Considerações finais

Nunca subestime o potencial que a alimentação pode ter sobre as mais diversas condições patológicas. Vimos aqui, por meio de um caso real e prático, como uma dieta com redução de carboidratos pode ser extremamente benéfica num caso onde os medicamentos são, muitas vezes, pouco efetivos ou trazem inúmeros efeitos adversos.

E esse é mais um exemplo do poder da Nutrição.


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Posts da série:





Referências

1. Kahrilas PJ. The role of hiatus hernia in GERD. Yale J Biol Med. 1999;72(2-3):101-11.

2. Gordon C, et al. The role of the hiatus hernia in gastro-oesophageal reflux disease. Aliment Pharmacol Ther. 2004;20(7):719-32.


23 comentários:

  1. Oi João, a informação de que carne gordurosas aumenta o refluxo procede? Apenas ouço os médicos falarem mas ainda não encontrei uma justificativa plausível e embasada.Obrigado

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    1. Olá, Bruno.

      Não existem evidências para isso. Na verdade, exitem pouquíssimas evidências que poderiam "condenar" qualquer alimento específico como fator capaz de desencadear o refluxo. Para qualquer alimento, ingrediente ou tempero, recomendo que a pessoa teste se, para ela, o consumo leva ao surgimento de sintomas de refluxo ou qualquer outro sintoma.

      Se não tiver sintomas, então não tem por que restringir. Ressalto que, se suspeitar de mais de um alimento, teste apenas um por vez para que seja possível distinguir melhor a influência de cada alimento sobre o surgimento de sintomas.

      Só para exemplificar, recentemente vi um caso de um paciente, diagnosticado previamente com gastrite, que tinha sintomas toda vez que aumentava o consumo de leite. O leite a princípio não tem relação com a gastrite (laticínios, principalmente o iogurte, podem até ajudar na gastrite), mas nesse caso o paciente apresentava sintomas com seu consumo. Por isso, o ideal nesse caso é restringir o consumo de leite até uma quantidade tolerada pelo paciente, mesmo que isso leve à exclusão total do alimento.

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  2. Estou há dois meses sem ingerir trigo e há dois meses sem ter azia. Até já guardei o vidro de antiácido, que ficava sempre na pia do banheiro.

    Será coincidência? :)

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  3. Corrigindo: são 3 meses, pois comecei em meados de agosto.

    Minha digestão melhorou muito sem o trigo. Não só a azia melhorou mas também a flatulência diminuiu muito. Esse alimento não volta mais para minha mesa, pelo menos no dia-a-dia.

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  4. Oláa João,
    Gostei bastante dos dois textos falando sobre refluxo,
    tenho refluxo, hernia de hiato e gastrite, já to sofrendo disso a alguns meses
    e os medicamentos não estão resolvendo na verdade acabei tendo efeitos colaterais
    como um grande aumento da minha prolactina, já troquei de medicamentos, passei por outros
    especialistas e só piora, desde que soube do quadro cortei tudo que dizem fazer mal
    café, chocolate, frituras, doces, iogurte, fui em uma nutricionista mas que me passou uma dieta normal digamos assim com bastante carboidrato rs mas ainda não obtive melhora
    só percebo que se comer alguma coisa que me de mais azia (no meu caso até maça me faz mal) a dor aumenta bem mais.
    Ando pesquisando bastante sobre como melhorar através da alimentação
    vou fazer a dieta com redução de carboidrato, depois ti conto a minha experiência!!
    já fiz a dieta paleo uma vez para emagrecer infelizmente na minha cidade é bem dificil achar um nutricionista que trabalhe com dietas low carb
    sabe me dizer o limite de carbo por dias sei que isso é bem individual, porém se puder falar no
    geral.
    Muito Obrigada
    Parabéns pelo seu trabalho.

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    1. Olá, Jessica!

      Todos os estudos que avaliaram o efeito da restrição de carboidratos no refluxo utilizaram entre 20 e 50 g/dia. Então esse seriam bons números para experimentar inicialmente.

      Boa sorte no processo e sinta-se à vontade para voltar e compartilhar os resultados!

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  5. Fiquei muito feliz em ler este post, sou estudante de nutrição, e há pouco descobri que tenho gastrite. Mas não sabia se poderia fazer ou não low carb por causa do consumo de gordura. Tenho muito refluxo principalmente quando como carboidratos, já fiz low carb e parei devido ao medo da gastrite, mas depois desse relato vou voltar e tentar e ver o resultado e como me sentirei.
    Obrigada por compartilhar.

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    1. Olá, Juliana.

      Acho que é exatamente esse o pensamento: conhecer as possibilidades, experimentar e ver se o resultado é positivo para cada caso específico.

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  6. Boa Tarde,
    Quem tem refluxo pode fazer dieta low carb? Minha médica cortou praticamente tudo de gordura e agora? Como vou comer meu santo bacon com ovos? kkkk

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    1. Olá, Silvana.

      Pacientes com refluxo não só podem fazer dieta low-carb como deveriam considerar essa abordagem como uma das primeiras opções.

      Com todo respeito a sua médica, a crença de que gorduras fazem mal para pessoas com gastrite ou refluxo não tem embasamento científico. A não ser que tenha sido diretamente e corretamente testado para o caso específico do paciente, mostrando que pode ser prejudicial para o indivíduo, não tem por que limitar a ingestão de gorduras.

      Apesar disso, alimentos que possuem aditivos alimentares em sua composição, como o bacon e diversos outros produtos processados e industrializados, devem ser bem pensados antes de serem consumidos por pessoas com refluxo. Apesar de não haver estudos sobre o assunto, sempre existe a possibilidade de substâncias externas (como os aditivos) afetarem negativamente condições como o refluxo.

      Com o ovo a princípio não precisa se preocupar, assim como com outros alimentos (comida de verdade) naturalmente ricos em gorduras -- a não ser que, no seu caso, você já tenha experimentado com tais alimentos e verificado que eles podem ser prejudiciais para o seu quadro específico.

      Vale lembrar que uma dieta low-carb não necessariamente vai ser igualmente eficaz para todos os pacientes. Mas, como falei, é sim uma das melhores opções que temos para o refluxo.

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  7. Olá! Excelente!
    Comecei a prestar atenção e me incomodar com outros sintomas de refluxo quando passaram a afetar minha performance no canto. Sou soprano em um coro e comecei a ter muita dificuldade em atingir as notas mais agudas. Primeiro pensei que tinha alguma alergia, depois relacionei ao mal estar após as refeições, com arrotos ou líquidos ácidos voltando para a garganta. Então tentei melhorar a alimentação, tirando tudo aquilo que na internet se diz que piora o refluxo e a acidez do estômago, e a mudar hábitos, como deitar após me alimentar, ou comer muito rápido. Por sugestão de um professor, tentei parar de consumir glúten, e também a tomar chá de espinheira santa. Concluí que esses sintomas haviam ficado evidentes quando passei a consumir muitos salgados, então achei que retirando o glúten melhoraria. Mas só senti melhoras em relação ao canto quando passei a comer mais devagar, o que muitas vezes não conseguia, sendo mais comum eu não atingir os agudos. Continuei imaginando que a chave estaria em sempre comer mais devagar, juntamente com todos os outros mil cuidados. Mas continuando a pesquisar sobre o assunto na internet, continuava descobrindo outros 'erros' no meu comportamento, imaginando que apenas quando eu fizesse tudo certo, incluindo não ficar muito tempo sem comer, é que minha performance no canto ficaria boa e estável, mesmo tendo a regurgitação melhorado há meses.
    Já havia feito endoscopia e fisiologicamente estava tudo bem, apenas foi detectada a presença da H. Pylori, que tratei com antibióticos e Omeprazol, o que não melhorou em nada os sintomas do refluxo. Também uma laringoscopia havia mostrado estar tudo em ordem com as cordas vocais. E eu voltava pra estaca zero. Ao ler esses posts foi que muita coisa se tornou mais clara pra mim. E também levantou algumas questões... Os sintomas haviam piorado não necessariamente pelo consumo excessivo de salgados, mas pelo aumento de peso. Agora que emagreci, primeiramente com restrição de calorias, e recentemente com uma dieta low carb, por já não haver muitos quilos a perder, a restrição de carboidratos não tem sido tão rigorosa assim. Minha esperança agora é que, mantendo o consumo entre 20g a 50g, eu consiga finalmente atacar a causa do problema do refluxo. Também fiquei aliviada ao saber que não preciso me preocupar com a acidez do estômago.
    Minhas dúvidas são: o refluxo pode irritar a região da garganta para além do momento logo após a refeição? Porque muitas vezes durante a deglutição eu já sinto alguma irritação na garganta, então me pergunto se a garganta pode estar sensibilizada pelo ácido de refeições anteriores, ou se nesses casos não há relação com o refluxo, ou ainda se o refluxo já está em ação mesmo que eu não perceba.
    Já identifiquei alimentos específicos que na deglutição irritam minha garganta (extrato de soja, bebidas com cafeína, laticínios), mas mesmo cortando esses alimentos o problema na garganta persiste, o que atribuo ao refluxo. Por outro lado, além de pigarros e até tosse durante ou logo após as refeições, meu nariz escorre na maioria das refeições, e apesar de nunca conseguir ter relacionado isso a alimentos específicos, será que (não sei se você pode me dar alguma opinião nesse sentido, mas vou arriscar), também pode existir alguma alergia alimentar que, juntamente com o refluxo, possa estar prejudicando minha garganta?
    Outra dúvida: já que a pressão intra-abdominal também pode ser responsável pelo mau funcionamento do esfíncter, além do excesso de gordura abdominal ou de bactérias no intestino delgado, a má postura é capaz de aumentar essa pressão e fazer funcionar mal o esfíncter? Porque antes mesmo de ler esse post eu resolvi observar se esses arrotos pioram quando me alimento numa má postura, o que faço sempre. Após ler o post, tomei mais cuidado com a postura e acho que pode haver essa relação, embora eu ainda precise de mais tempo de observação pra chegar a uma conclusão.
    Desculpe o texto enorme, acho que abusei da sua solicitude. Muito obrigada pelas informações e parabéns pelo blog!
    -Lu

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    1. Olá, Lu.

      Sim, a irritação causada pelo refluxo de momentos anteriores pode influenciar os sintomas que você sente em refeições seguintes. Além disso, apesar de talvez ser pouco provável ou em menor grau, existe sim a possibilidade de estar acontecendo um leve refluxo durante as refeições. Mas a questão das irritações prévias é o fator mais importante que deve estar contribuindo para os seus sintomas.

      Se você não apresentar nenhum outro sinal ou sintoma característico de alergias, acho difícil o fato de o seu nariz escorrer ser um indicativo de alergia alimentar -- ainda mais porque você não associou com nenhum alimento específico. Nariz escorrendo pode ser um simples "reflexo" do ato de se alimentar, tendo em vista que esse ato de fato leva ao estímulo de várias secreções corporais, inclusive nas vias áreas. Pigarro e tosse podem também ser decorrentes dessa estimulação, além de resultados diretos da irritação causada pelo refluxo.

      Sinceramente não sei muito sobre a relação entre postura ao se alimentar e refluxo, e não sei se esse assunto já foi cientificamente estudado. Um médico que trabalha com isso, que tenha pelo menos uma boa experiência prática, talvez possa te dar uma resposta melhor. Mas, considerando que uma postura adequada no pós-refeição ajuda a aliviar o refluxo, e que de certa forma faz sentido pensar que se alimentar numa postura "inadequada" poderia contribuir para a piora do refluxo, acho que não custa nada tentar se alimentar com uma postura mais "adequada".

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  8. Comecei ontem à LowCarb e até aí tudo bem, fui dormir muito feliz pois no 1 dia já tinha eliminado 2kg e comendo super bem, Mas na madrugada comecei sentir uma dor horrível de cabeça, e então tomei um paracetamol, logo ao amanhecer vomitei aquele ácido horrivel. Eu tenho gastrite crônica, será que a dieta pode piorar o quadro?

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    1. Olá.

      Possibilidades sempre existem quando o assunto é nutrição, mas é pouco provável que o seu quadro piore com uma dieta low-carb. O máximo de "ruim" que pode acontecer, caso venha a acontecer, é de não melhorar a sua situação.

      Você pode experimentar por mais um tempo para ver se esse não foi um episódio isolado, e se teve algumas coisa a ver ou não com a dieta. Tem grandes de chances de ter sido algo esporádico e/ou não relacionado a alimentação.

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  9. Fiquei feliz em achar o seu ótimo trabalho! Parabéns pelo blog!

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  10. Bom dia João,
    Muitos parabéns pelo conteúdo! No que toca ao tratamento do refluxo tenho uma dúvida em relação à suplementação com hidrocloreto de betaína com o objectivo de aumentar a acidez no estômago. Segundo Chris Kresser* uma parte muito importante do tratamento e prevenção do regresso do refluxo, assim como para um boa digestão e saúde no geral, é a reposição de ácido no estômago. Parece que com o passar dos anos o nosso estômago vai produzindo menos ácido e essa pode ser a razão pelo aparecimento do refluxo: menos ácido = má digestão dos hidratos de carbono = mais substrato alimentar para as bactérias do intestino delgado = proliferação de bactérias = SIBO = refluxo. E a verdade é que percebo que a minha situação com o refluxo parece piorar ao longo do tempo. Tenho neste momento 34 anos. Vou começar uma dieta muito pobre em hidratos de carbono para tentar resolver o meu problema, venho de um período de 2 meses a tomar omeprazol (é bom no inicio mas depois agrava a doença como já sabemos, que parece ter sido o que aconteceu comigo), e tenho dúvida se devo começar a utilizar já hidrocloreto de betaína. Alguns vídeos e artigo que li até dizem apenas para utilizar o reforço de ácido no estômago para resolver o problema. Para mim parece fazer todo o sentido fazer essa reposição de ácido na hora das refeições mas a minha grande dúvida é: num primeiro momento, isso não pode afectar ainda mais as paredes de um estômago e do um esófago mal tratado pelo refluxo ou uma gastrite? Qual a sua opinião sobre este assunto? Pretendo sim utilizar o reforço de ácido, nem que seja só depois de melhorar bastante ou eliminar o refluxo com o low-carb, até mesmo para tentar perceber se dessa forma me ajuda a manter uma maior ingestão de hidratos de carbono sem o regresso do refluxo. Mas será interessante começar logo a suplementação com hidrocloreto de betaína quando o esófago está lesionado? Será que vale a pena passar por um possível agravamento dos sintomas (primeiramente, mais ácido = maior ataque ao esófago) para conseguir uma melhor resposta na eliminação de bactérias (tal como a H. Pylori) que esse ácido proporciona?

    É engraçado o confronto entre diminuir o ácido (omeprazol) vs aumentar o ácido (hidrocloreto). Um melhora os sintomas mas agrava a doença, o outro acredito que pode piorar os sintomas mas parece ser um grande contributo para eliminar a doença pela raiz.
    Agradeço desde já disponibilidade!
    Cumprimentos,
    António

    *https://chriskresser.com/heartburn/

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    1. Olá, António.

      Obrigado pela pergunta. Primeiro vale ressaltar que, em termos de estudos, não temos evidências suficientes para sugerir que fazer a suplementação com algum tipo de ácido (como betaína HCl) seria melhor, igual ou pior do que não suplementar durante o tratamento de refluxo.

      Apesar disso, na minha prática com pacientes, o que eu observo é que essa suplementação certamente não é essencial. Mesmo sem ela, já tratei diversos pacientes com 100% de sucesso com uma dieta não processada com restrição de carboidratos.

      É possível que esse tipo de suplementação acelere a recuperação, pelo menos em alguns casos, e o que faltam são evidências científicas para confirmarmos isso? Sim, é uma possibilidade plausível. Mas saber que a suplementação não é essencial, pelo menos em boa parte dos casos, é segurança suficiente para não perder a cabeça só por causa disso.

      Considerando minha experiência prática, inicialmente eu recomendaria, na maioria dos casos, não se preocupar com a suplementação. Depois de alguns meses, se uma dieta não processada restrita em carboidratos não for suficiente para eliminar sintomas (queimação) e sinais (lesões observadas por endoscopia) do refluxo, aí sim eu pensaria em outras possibilidades como combinar com a suplementação de betaína HCl. Apesar disso, não sou totalmente contrário a já iniciar o tratamento com a suplementação.

      Boa sorte.

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    2. Bom dia João,
      Foi já há 2 meses que descrevi a minha dúvida em relação à suplementação com betaína HCL por causa do refluxo. Agradeço imenso a resposta que me deu! Desde aí muita coisa aconteceu, fiz uma endoscopia com biopsia e afinal parece que não é muito concreto se tenho refluxo ou não (não tinha nenhum tipo de hérnia nem lesões no esófago mas o médico referiu que o esfíncter esofágico poderia estar um pouco frouxo). O certo é que tinha uma gastrite crónica e duodenite devido a uma infecção por H. Pylori. Tomei 2 tipos de antibióticos durante duas semanas + pantoprazol, neste momento ainda estou a tomar pantoprazol 20mg, 1 comprimido ao deitar e ao acordar. Estou também a comer mais limpo e consumo poucos hidratos de carbono (excluí cereais mas vou comendo alguma batata ou batata doce e frutas). Não estou a beber leite mas tenho consumido iogurtes naturais e queijos.

      Não tenho tido náuseas, acontecia-me muito de manhã, ao acordar, recentemente só aconteceu 1 vez quando comi pior por alguns dias, como beber leite, pão, processados ou álcool. No entanto, vou sentindo algum desconforto no estômago. A meio da noite ainda me acontece algo que tem sido recorrente no último ano (e que já me aconteceu, de forma menos regular, também em anos anteriores), que é acordar a meio da noite com um sentimento de vazio no estômago, um certo desconforto que parece ser uma ligeira queimação. Às vezes também sinto durante o dia. As vezes que experimentei suplementar com betaína HCL também senti o estômago a queimar com um pouco mais de intensidade, pelo que deixei essa suplementação.

      Quero acreditar que neste momento, tendo em conta que já tomei antibiótico, já eliminei a H. Pylori, mas tudo indica que as paredes do estômago continuem mal tratadas das sequelas da infecção e não tenho certeza se está a ocorrer uma decente cicatrização das paredes do estômago. Às vezes também tenho a sensação que o pantoprazol me está a trazer algum desconforto intestinal mas vou mantendo a toma, como indicado pelo médico.

      A minha dúvida aqui é, para casos semelhantes ao meu, quais são as directrizes que mais aconselha aos seus pacientes para uma decente reconstrução das paredes do estômago (e neste caso também do duodeno) e para prevenir ou minimizar a proliferação de novas infecções por H. Pylori?

      Muito obrigado!
      Cumprimentos,
      António

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    3. Esqueci de mencionar, também estou a tomar probióticos e comecei há pouco tempo a beber chá de espinheira santa. Sou português, a residir em Portugal, mas tenho me apercebido que há muita informação brasileira a recomendar a espinheira santa para o estômago.

      António

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    4. Olá, António.

      Não são muitos, mas os estudos sobre o efeito da espinheira santa no estômago sugerem que o mecanismo é semelhante ao de medicamentos como o pantoprazol. Isso quer dizer que os sintomas podem ser reduzidos, mas não quer dizer que a suplementação vai agir na raiz do problema.

      Por esse motivo, a minha opinião é que nem os medicamentos como pantoprazol e nem a espinheira santa deveriam ser usados por muito tempo, se a questão é melhorar a causa do refluxo e problemas associados. A inibição dos sintomas pode atrapalhar a pessoa de perceber se a alimentação está sendo efetiva em realmente tratar o quadro clínico.

      Além disso, eu não costumo recomendar a suplementação de várias coisas diferentes ao mesmo tempo. Não que isso seja algo intrinsecamente errado, só não acho que seja a melhor opção em muitos casos. Apesar de ser uma condição incômoda, o refluxo e os problemas associados a ele não caracterizam um quadro tão grave. Ou seja, o paciente tem tempo para testar diversas opções e modificações na alimentação, pouco a pouco, até ir descobrindo o que melhora ou não o seu quadro. Entendo que os sintomas são desconfortáveis, mas acredito que experimentar aos poucos é a melhor forma de entender o processo. Por não se tratar de um problema tão sério, não existem muita razão para se ter pressa.

      Em relação à segunda parte da sua dúvida, a melhor forma de prevenir ou minimizar a proliferação de H. pylori é a própria manutenção da saúde gastrointestinal, incluindo a secreção adequada de suco gástrico. Esse é um motivo muito importante para explicar por qeu não é uma boa ideia o uso prolongado de medicamentos como pantoprazol e possivelmente espinheira santa (mas não tem como ter certeza sobre ela, pois não realmente sabemos como ela atua no estômago).

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